Quando passo naquele bairro onde tu acampou por três meses,
a maresia me trás teu cheiro, as vezes me mareja os olhos. Em outras molha
minha calcinha. E prender a respiração não resolve porque tuas unhas nunca
saíram das minhas costas. E ouço o tilintar dos teus brincos nos meus dentes,
sinto tuas coxas nas minhas orelhas, e ouço todas aquelas músicas que eram tuas
e minhas. E tuas e da Regina. Tuas e da Ana Paula. E da Bárbara, e da Cris, e
nem quero prosseguir na minha lista. Sabe que tu além de ser irritantemente
linda é extremamente nociva? Gostar de ti me largou lá no alto da montanha
russa, sabe como é? Quando a gente não tem opção a não ser descer naquele trem
inseguro que começa com frio na barriga e termina em grito de desespero. Porque
contigo, lindeza, nunca termina em alívio.
Essa noite eu tive um sonho estranho.
Tinha uma moça por quem eu era apaixonada. Tão bom, tinha uma saudade! Era tão real que quando acordei
fiquei procurando em mim por aquele rosto, aquele nome e nada. Depois de meio
litro de café entendi. Quis tanto te esquecer, sabe? Tirar de mim o visgo do
teu cheiro, do teu gosto, esquecer teu olhar, quis tanto que deu certo,
consegui. Mas o imbecil do meu subconsciente não. Ele fica ali tentando jogar
tua voz nos meus ouvidos. Me faz procurar pela tua foto na parede e fico
olhando, fingindo que nem sei o que procuro, mas ele fica ali, na competente
tentativa de me enlouquecer. Mas eu falava do sonho... Não. Esquece o sonho...
Ontem, na terapia, a doutora me disse que o que faz minha depressão piorar é
meu estágio avançado de consciência...
Viu que legal? Tua pseudo-namoradinha além de melhor sexo oral da terra
ainda tem um avançado estágio de consciência. Não sei se é mais desperdício de
língua ou de neurônio... Nem sei o que vim fazer aqui. Deve ter sido o sonho
que me fez lembrar de como é bom ter alguém pra contar alguma coisa. Putz, meu
supra estágio de consciência acaba de me lembrar que nunca pude contar nada a
não ser se rolava ou não tudo que tu querias comer em mim... Deixa
pra lá. Vou tentar não sonhar mais.
Um comentário:
Sonha
Capaz que você componha
Para além da consciência
Um certo estado de demência
Que com eloquência
Morda a fronha
E risonha
Molhada
Sejas enfim celebrada
Em verso, prosa e palavra cantada
A cadência da vida é ritmada
Pura indescência
Paciência
Mas ponha
O sonho na cadência...
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